quarta-feira, 23 de março de 2011

3. Reflexão quaresmal

Deus, Misericórdia Infinita.

A palavra “misericórdia” está entre as que mais frequentemente aparecem nos escritos de São Vicente Pallotti. Ele, desde o início, pensou a União do Apostolado Católico (UAC) como uma instituição para realizar obras de misericórdia. Para os que, de alguma forma, querem fazer parte da Família Palotina, é indispensável penetrar, o mais possível, nas riquezas da “misericórdia”.

A palavra ‘misericórdia’
As palavras em Hebraico e em Grego indicam aquilo que, nas línguas modernas, se traduzem por amor, ternura, compaixão, caridade, piedade, benevolência, bondade, algumas vezes até por graça.

No entanto, o significado bíblico dessa palavra é claro: representa ternura de Deus para com a miséria humana e também atitude que devemos ter para com o nosso semelhante, à imitação do nosso Criador. Não compreender a profundidade dessa palavra comporta um duplo risco em relação a Deus e ao próximo.
- conceber Deus mais como juiz do que Pai misericordioso pode nos levar ao desespero em vista dos nossos pecados.
- faltar com uma autêntica solidariedade para com os nossos semelhantes pode fazer com que nos aproximemos deles de forma errada, ou nos condenemos ao isolamento.

Misericórdia de Deus
Pallotti, consciente de seu “nada e pecado”, se entrega à misericórdia divina, feliz pelo perdão, pela gratuidade, pela predileção imerecida. Daí que quase todas as suas orações iniciam invocando “Deus, minha misericórdia infinita” e freqüentemente se define a si mesmo “prodígio de misericórdia”, e “milagre, troféu, abismo ... da sua misericórdia” (OOCC X, 356-357).

E realmente São Vicente pode chamar a Deus de “minha misericórdia”, porque vive de maneira concreta e pessoal a misericórdia de Deus, chegando a exclamar: “Meu Jesus, meu juiz, morto para não me condenar à morte!” (OOCC X, 668)

Esse equilíbrio entre a consciência dos próprios limites e a certeza da ilimitada misericórdia de Deus, permitiu a Pallotti sentir serenamente, sem complexo de culpa e sem ilusão de perfeição, a consciência dos próprios pecados, “destruídos” aos poucos pela misericórdia de Deus no sacramento da reconciliação, a que recorria com freqüência e com muito fervor.
De resto, compreender a misericórdia de Deus significa entrar numa atitude de humildade autêntica e de verdadeira contrição (Sl 50) e, ao mesmo tempo, na confiança e gratidão para com Deus, Pai e Senhor de misericórdia (Sb 9, 1).

Misericórdia dos homens
Se Deus em sua misericórdia se “inclina” sobre o pobre e Jesus quis experimentar a mesma pobreza dos que vinha salvar (Hb 2, 17) - nós somos chamados a manifestar os sentimentos de “solidariedade” para com aqueles que, além de partilhar conosco a mesma limitação da condição humana, se encontra em situação menos favorecida. Ter misericórdia significa ter o coração de Deus, permitir-lhe pulsar nesta humanidade sofredora. Mas ... como concretizar a misericórdia?

O caminho pessoal e comunitário de fé nos dá uma visão do problemas individuais e coletivos da realidade em que vivemos: não existem receitas prontas, mas, como se diz, o amor é um bom conselheiro!

Vejamos alguns exemplos:
da Bíblia: o ser humano consciente de ser objeto da misericórdia de Deus é chamado a perdoar (cfr Lc 6,36), a parar diante das necessidades do próximo (Lc 10,29-37), a amar sem medidas (Lc 6, 27-35).

do Concílio Vaticano II: “enquanto todo o exercício do apostolado deve buscar sua origem e força na caridade, algumas obras são por sua natureza aptas a converter-se em expressão viva da mesma caridade, obras essas que o Cristo Senhor quis fossem sinais de uma Missão messiânica ... por isso a misericórdia para com os pobres e doentes e as assim chamadas obras de caridade e de auxílio mútuo, para aliviar as anímodas necessidades humanas, são tidas pela Igreja em estima particular”(AA 8). O parágrafo prossegue explicando quem é o próximo no mundo de hoje e dita regras preciosas sobre o modo de realizar a caridade sem hipocrisia, sobre a atitude cristã - humilde que não humilha - de que falávamos no início. É uma página do Concílio digna de ser meditada por todos, especialmente por aqueles que procuram viver a espiritualidade palotina.


A nossa ... misericórdia
Considerando a experiência que hoje temos da União do Apostolado Católico, sentimos um grande estímulo, pois os membros da Família Palotina estão em todo o mundo trabalhando nos mais variados campos a favor dos irmãos mais necessitados: nas missões, nas prisões, junto aos marginalizados, doentes, drogados em defesa da vida, etc. É tarefa da União envolver sempre mais a comunidade nesse trabalho, e estar sempre pronta a reconhecer necessidades novas ou negligenciadas. De resto, o hino a caridade dos I Coríntios, tão caro a São Vicente, é, em certo sentido o distintivo da nossa união e muito sugestivo!

Examinando a vida de Pallotti, notamos que, enquanto seus escritos falam apenas do bem que não conseguia fazer, os biógrafos nos escrevem as suas jornadas incrivelmente cheias de obras de misericórdia; obras concretas com as quais atingia a todos aqueles que sabia necessitados de conforto moral e espiritual e de assistência material, nas casas, pelas estradas, nas prisões, nos hospitais ou nas igrejas, e em particular no confessionário; obras realizadas com sentimentos de profunda e sincera caridade.

Mas contemplar um modelo, neste caso S. Vicente Pallotti, significa inevitavelmente confrontar-nos com ele e questionar-nos. O exame de consciência, abaixo, será tanto mais profundo e detalhado quanto mais tivermos progredido no caminho de santidade. Aproximar-nos de Deus é de fato como aproximar-nos de um espelho: quanto mais diminui a distância, tanto mais aparecem os defeitos e as rugas!

Comecemos portanto por nos perguntar: como ocupamos os nossos dias, sobre os sentimentos que envolvem as nossas ações... E se a pressa, a ânsia ou o aborrecimento envolvem a nossa vida ou se por falta de autêntica caridade somos semelhante a “um bronze que soa ou como um símbalo que tine” (lCor 13,1), deixemo-nos estimular pelas palavras de Jesus, segundo as quais, se formos misericordiosos, seremos felizes e também obteremos misericórdia (Mt 5,7). Enfim, recordando que ser misericordioso é dom que se deve pedir a Deus, unamo-nos a S. Vicente Pallotti que meditava esse versículo do Evangelho na seguinte oração . Oração para obter misericórdia.

Pe. Valdeci Antonio de Almeida, SAC.

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