sexta-feira, 10 de julho de 2009

Mensagem do Arcebispo de Londrina

Dom Orlando Brandes
VANTAGENS DO PERDÃO

Perdoar não é fácil, mas é o caminho mais eficaz para a convivência humana saudável e feliz. Nosso viver e conviver sobrevivem graças ao perdão que e uma atitude de amor incondicional, de compreensão, de misericórdia e de alta sabedoria.
Quem não perdoa é um perdedor. Perde de dois a zero porque frustra o relacionamento humano e carrega dentro de si o lixo da mágoa e amargura. Quem perdoa alcança o zero a zero, ou seja, restabelece a comunhão e expulsa o veneno do ressentimento. Terá saúde física, psicológica, social e espiritual. O perdão é remédio, cura, excelente terapia.
Quem não perdoa, não esquece o mal e sofre a doença da “compulsão da repetição”; vive sempre lembrando, repetindo, desabafando a dor interna. Por não perdoar irá sempre culpar alguém e vingar-se. Isso tudo aumenta o sofrimento e o desgaste físico. Perdoar é tirar a raiz da amargura.
Perdoar é compreender, desistir de julgar e de culpar os outros. Isto é possível quando reconhecemos que somos barro. Ninguém e infalível. Quando aceitamos nosso barro e o dos outros, conseguimos perdoar. Com o perdão conseguimos dar um novo significado ao fato que nos magoou, temos nova compreensão, novo olhar, novo sentimento sobre fatos e pessoas. O perdão muda a realidade porque é encontro com a verdade.
Perdoar é reatar o relacionamento rompido, e colocar-se nas mãos do outro, abdicar do julgamento pessoal. É um gesto de gratuidade no qual fazemos o dom de nós mesmos. Sem o perdão somos pesados, doentes, depressivos, agressivos, desumanos. Perdoar é reumanização de si.
A falta de perdão torna falsa e estéril a oração. O rancor, a mágoa, a ressentimento impedem a ação da graça. O sentimento negativo é uma energia venenosa que se transforma em doença, insônia, agressividade, imoralidade, alcoolismo, barulho, farra, etc. Muitos problemas da vida têm sua raiz na falta de perdão.
A magoa, o ressentimento, a amargura, são energias e sentimentos destrutivos.
Assim, quem não perdoa odeia a verdade, carrega veneno na alma, destrói o bem, afasta-se da caridade, vive no azedume e crítica, fere o coração, morre aos poucos, sente-se perdido. Só resta o vazio, a solidão e a algazarra para abafar o mal-estar interior.
As consequências negativas da falta de perdão são tão perigosas e destruidoras que a Bíblia aconselha a perdoar antes do par do sol. Não deixar para amanhã. Não ir dormir com raiva: “Não se ponha o sol sobre vossa ira” (Ef 4,26). Igualmente Jesus manda perdoar setenta vezes sete, isto é, sempre, imediatamente e de todo coração.O perdão é tão benéfico que deve ser dado incondicionalmente, totalmente, incansavelmente. Na oração do Pai Nosso, o perdão está ao lado do pão de cada dia. O perdão também é pão da vida, porque é o amor sem medidas, amor de mãe, amor misericordioso. É o perdão que possibilita a fraternidade e a boa qualidade do relacionamento humano.


Dom Orlando Brandes



A ARTE DA ORAÇÃO

Rezar é um ato natural, um capítulo da antropologia, exatamente porque o ser humano tem uma abertura congênita para o transcendente, o divino. Rezar é também um ato de justiça para com nossa alma, pois a oração é expressão do espírito, da alma, do coração. É também um ato de justiça em relação a Deus. “Nele somos, vivemos e existimos” (At 17,28).
A oração é antes de tudo terapêutica porque pacifica, unifica, ordena a vida, os pensamentos e os afetos. “Os efeitos da oração em nossa pessoa são mais visíveis que os das glândulas de secreção interna”, diz o prêmio Nobel da medicina (1922), Dr. Alexis Carrel, ateu convertido.
A arte da oração consiste em que o orante se comunica com Deus, com os outros e consigo mesmo e assim faz grandes descobertas, encontra soluções, recebe iluminações e muita força interior. K. Jung e V. Frankl são psicólogos que exaltam a importância e a eficácia da oração, sem a qual, as pessoas não se curam de suas neuroses. Eles sabem muito bem que a pessoa orante entra no nível alfa, freqüência profunda do cérebro humano.
Quem não reza está numa situação muito desconfortável e até incômoda, porque irá buscar alívio e sedativo no álcool, farras, drogas e sempre permanece vítima do vazio existencial e da solidão. Sempre justificará seus erros e fugas, tendo necessidade espontânea de ridicularizar quem reza, como se a oração fosse o “catecismo dos fracos e perdedores”. De fato, só os humildes e autênticos rezam:
É preciso rezar com fé. Acreditar no poder da oração. Rezar é estar com Deus e com os outros. Normalmente a oração verdadeira e profunda leva à compaixão, ao perdão, à solidariedade. O amor é fruto da oração. Rezar é um ato de amor e o amor é conseqüência da oração. Os santos, os místicos são sempre pessoas de paz, de fraternidade e de ação em favor dos pobres e pecadores. A oração é amor de amizade com Deus que nos leva ao amor-serviço para com os outros.
A oração é uma “alavanca que move o mundo” (Sta. Terezinha). De fato, quantas pessoas são vitoriosas frente a doenças, mágoas, decepções, injúrias. A oração as salvou. Quem reza se salva. A oração é uma ponte. A pessoa orante é fabricadora de pontes, é pontífice. Abatem-se os muros, constroem-se pontes, com a sabedoria da oração. Esta ponte, a oração, vai da terra ao céu e do coração do orante aos irmãos. A escalada da oração é exigente, requer perseverança. É um combate. A oração é muralha, é escudo, é proteção, é abrigo, é segurança. Quem reza está imunizado contra muitos males. A oração nos protege das tentações. Sem oração caímos na murmuração e abraçamos a tentação.
A oração é escola. O mestre interior é o Espírito Santo. Na escola da oração aprendemos a prática do bem, a beleza do perdão, a alegria da convivência, a esperança nas decepções. A oração nos faz discípulos, iluminados, sábios, humanos e verdadeiros. Moisés tinha o rosto iluminado após a oração. Irradiava o fulgor de Deus!
A oração enche o orante de audácia e coragem, de força e tenacidade, de luz e compaixão. Jesus não somente reza, mas, ensina a rezar, principalmente a perseverança na oração. Os primeiros cristãos eram “assíduos na oração” (At 2, 42). De fato, a oração é inspiração de cada momento, recolhimento do coração, recordação das maravilhas de Deus, é força para a luta cotidiana. Eis a arte da oração.
A oração é uma rendição diante de nossa insuficiência e da paternidade de Deus. A oração é a fala entre filhos(as) e Pai. Portanto, oração é questão de amizade; é encontro de duas consciências, duas intimidades, duas existências. Na oração acontece uma troca de olhares, de confidências, de interioridades. Rezar é um ato de amor, um ato afetivo que inflama o orante de amor a Deus e ao próximo.

Dom Orlando Brandes

A HUMILDADE DE DEUS

Deus é infinito, absoluto, perfeito e santo. Deus é amor. Por isso é humilde.
Sua primeira humildade está no ato da criação do homem. Permite existir um outro que em sua liberdade pode contrariá-lo, ofendê-lo, e dele discordar. Deus se contrai, se autolimita para que suas criaturas possam existir. É humildade de Deus acolher em seu mistério o outro diferente e livre. Deus aceita limitar o seu poder. Aceira ser ofendido, não correspondido, não amado.
É humildade de Deus, criar as coisas imperfeitas e aceitar a colaboração do homem como concriador, administrador e aperfeiçoador de sua obra. Deus mesmo obedece as leis da criação que são imperfeitas e incompletas, quase a depor contra Ele. Mas, prefere se autolimitar, autocontrair, sofrer as limitações das criaturas para deixá-las existir e permitir que o homem as conduza e explore. Quanto sofrimento e humildade de Deus, num terremoto, numa catástrofe natural, numa doença cuja cura ele sabe qual é, mas em sua humildade, espera a descoberta deste remédio pela inteligência humana. Deus não faz o que o homem pode e deve fazer. Em sua humildade Deus confia e espera no homem. Humilha-se para que as criaturas existam e possam seguir sua evolução natural. Tão humilde e sofredor é Deus, que não vive interferindo nas criaturas, como que fazendo milagre a todo instante. Em sua humildade, adapta-se aos estágios da evolução e em sua providência conduz a vida, a natureza, a história sem tirar-lhes a liberdade, a autonomia, o livre arbítrio.
Deus é humilde, sua paciência e misericórdia com o homem livre e pecador, não destruindo o mal, mas esperando na capacidade humana de ouvir a consciência e mudar de vida. Deus não destrói nem castiga o pecador, mas permite provações que serão benéficas no contexto. Deus é humilde ao escolher representantes seus, como é o caso de padres, bispos, religiosas, cheios de limitações e imperfeições. Ele não se envergonha de nossa fraqueza, ao lidar com pessoas defeituosas, limitadas, pecadoras. Deus é humilde, porque podia tudo resolver à força de milagres e com um sopro de sua boca, mas prefere adaptar-se as demoras das criaturas, respeitar as leis naturais e sofrer com os que sofrem porque os ama. Deus pode tudo mas não quer nos salvar contra nossa liberdade. O Onipotente, o Infinito aceita limitar seu poder. A virtude mais profunda da divindade é a humildade. Deus se abaixa, se inclina, é servidor do homem. Em sua humildade, ele bate à nossa porta e espera a resposta. Não arromba nem invade. Deus é mendigo do homem.
A humildade de Deus nós vemos estampada em Jesus, frágil da manjedoura.
Do mais alto céu, desceu ao lugar mais baixo, mais imundo. Da glória à estrebaria. Deus é humilde em Jesus pobre e peregrino, em Jesus no lava-pés e na cruz. Grande e o mistério da humildade de Deus. Porque é humilde, Deus é compassivo, misericordioso, benevolente, clemente, paciente. Na sua humildade reside sua majestade.
Dom Orlando Brandes
Arcebispo de Londrina