segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Giornale di Roma - 1850



HOMENAGENS FÚNEBRES AO PE. VICENTE PALLOTTI, FUNDADOR DA CONGREGAÇÃO E PIA SOCIEDADE DO APOSTOLADO CATÓLICO

Francesco Fabi Montani
Roma, 1850

Nota do Editor

Publicamos abaixo o texto sobre o funeral de Pe. Vicente Pallotti, escrito por Francesco Fabi Montani. Este texto foi publicado no “Giornale di Roma”, n. 25, do dia 30 de janeiro de 1850, p. 100. Arquivo do Instituto S. Vincente Pallotti – Roma (M/0006-36) mantém-se um excerto do texto impresso de seis páginas, tamanho 14x20 centímetros. A composição deste elogio de Francesco Fabi Montani serviu-se das notícias enviadas pelo fiel colaborador de Pallotti, Francesco Maria Vaccari. O texto de Vaccari foi publicado na Acta SAC (cf. Documentum contemporaneum da morte de Vicente Pallotti – Relatório da morte e funeral de São Vicente Pallotti, escrito por F. M. Vaccari e enviados pelo mesmo a Fabi Montana para o Jornal, no dia 24 de janeiro de 1850, editado por H. Schulte SAC, na Acta SAC IV, No. 11 (1960), Societas Apostolatus Catholici, Gráfrica de Roma, 1961, pp. 611-616).
O texto que publicamos foi assinado por Fr. Fabi Montani. Mas, quem foi Fabi
Montani? As informações obtidas de várias fontes dizem que ele nasceu em Sangemini, no ano de 1800 (Terni) e morreu em Roma, em outubro de 1870. Foi ordenado sacerdote em 1849, e nomeado canônico da Basílica Santa Maria Maggiore. Ele era um escritor conhecido, e
abordava diversos assuntos em seus textos (literários, artísticos, históricos, etc.), mas tornou-se conhecido pelo fato de abordar acuradas biografias de personagens eclesiásticas e leigas do século XIX. A vida e as atividades de Vicente Pallotti não eram desconhecidas de Fabi Montani. Se no “momento da pesquisa não temos vestígios documentais do seu contato com o Santo, mas sabemos que tinha laços de amizade com o Pe. Domenico Santucci , que no dia 14 de julho de 1835 foi secretário da primeira reunião da União do Apostolado Católico .
Nós, seguidores de São Vicente Pallotti, ficamos honrados de termos posse de um texto que descreve a vida e os funerais de Vicente Pallotti. O texto que segue está na íntegra, apenas com alguns retoques linguísticos, para facilitar a leitura.
O Texto do extrato
O corpo de Vicente Pallotti, paramentado com vestes sacerdotais, foi velado, às 5h 30 min, do dia 23 de janeiro, na capela interna, dia da festa do Esponsalício de Maria Santíssima, e depois transladado pelos seus confrades para a Igreja de São Salvador in Onda, onde mais tarde foi recitado o Ofício dos Defuntos. A missa de réquiem foi solenemente cantada com belíssimas orações feitas pelo Pe. Bernardino di Ferentino, leitor dos Menores Observantes, que bastaram poucas horas para preparar-se e distribuir abundantes cópias do seu piedoso discurso.
Apesar de Pallotti nunca ter gostado de pompas, o piedoso sacerdote recebeu em seus funerais grandes homenagens. Foi algo grandioso, comovente e digno de ser recordado. O tempo não trajava luto, não portava fachos luminosos, nem brasões, nem epígrafos. O caixão apenas jazia sobre uma humilde caixa, e apenas duas velas o circundavam. As exéquias foram modestíssimas, mas tocavam profundamente ao coração de todos.
Na manhã seguinte, o Monsenhor Giuseppe Angelini, Oficial Civil do Exmo. Vigário celebrou uma solene missa e Pe. Francesco Virili, sacerdote da Congregação do Preciosíssimo Sangue, filho espiritual do Servo de Deus, após o Evangelho, voltou a recordar as virtudes de Vicente Pallotti.
Finalmente, no terceiro dia, os alunos do Albergue Apostólico de São Miguel chegaram bem de manhazinha, e recitaram o Ofício Divino, participaram da missa, acompanhada da devota e comovente música cantada por eles mesmos. Mais tarde, o Prepósito da Doutrina Cristã pediu que, novamente, cantassem em outra celebração, na qual o Pe. Angelini, da Companhia de Jesus, professor de oratória no Colégio Romano, enalteceu mais uma vez a piedade e o zelo do ilustre defunto.
Nestes três dias, de boca em boca se difundia a triste notícia de sua morte, e crescia o número daqueles que queria celebrar a santa missa. Houve uma disputa entre o clero religioso e secular para irem àquela Igreja e prestar sua última homenagem ao Pe. Vicente Pallotti; à tarde e na maior parte da manhã houve uma contínua e espontânea recitação dos Salmos, pelos eclesiásticos religiosos e seculares. Isto sem falar de uma multidão de pessoas, de ambos os sexos, que foram alimentados com o Pão dos Anjos, se uniam reverentes sobre os restos mortais de Pe. Vicente. Insatisfeitos de olhá-lo e de tocá-lo com lenços e terços, abraçavam seus restos mortais com muita devoção. Foram distribuídos milhares de pedacinhos de suas roupas, outros raptados. Compareceram inúmeros Bispos, prelados, príncipes e militares. Acorreram ainda até São Salvador in Onda as meninas abandonadas da Pia Casa de Caridade, próximo ao Borgo de Santa Ágata, onde demonstrou seu zelo apostólico, e o Conservatório Carolino do Sagrado Coração perto de Santo Onofre, Janículo, servido singularmente por ele. Aos prantos e soluços beijavam sua gélida mão, que os havia libertado de mil perigos e que lhes dera socorro. As ruas contíguas à Igreja estavam repletas de pessoas, que em coro lamentavam a grande perda, recordando sua grande generosidade, seu exemplo de vida e de caridade evangélica.
No dia 25, sexta-feira, por volta da meia noite, o Pe. Francisco Maria Vaccari, Reitor da Casa, na presença do Revmo. Senhor Canônico Annivitti, promotor fiscal do Vicariato, do notário Monti, que lavrou o ato, e de outros notáveis, que não conseguiam desviar os olhos daquele amável rosto, fez as últimas indulgências diante do féretro, que tinha seus membros flexíveis, e não parecia estar morto, mas imerso em um profundíssimo sono. Pallotti foi depositado em três caixões e se podia vê-lo com os mesmos paramentos que usava na Igreja. Um dos caixões era de zinco e dentro de um tubo foi colocado uma breve inscrição em latim. Foi sepultado em um lugar de destaque, em uma nave perto do altar de São Salvador.
Vários pintores compareceram para retratá-lo em artes plásticas o seu rosto, o qual será recordado para sempre como um sacerdote benemérito de sua pátria, que se empenhou pelo bem-estar do próximo.
Era, verdadeiramente, conhecido por todos pelo seu talento filosófico e teológico. Foi professor suplente na Universidade Romana e, ao mesmo tempo, dava nome à Academia Teológica, da qual foi também censor. Como um bom eclesiástico, tornou-se conhecido como um hábil orador. Pouco tempo depois, o santo sacerdote abandonou a vida acadêmica para dedicar-se à evangelização, trabalhando com ardor desde o primeiro dia.
A sua caridade foi sincera, benéfica, universal; o seu zelo aceso, reto, incapaz de ser impedido por qualquer obstáculo humano. Diuturnamente, com fome e com sono, corria alegre em direção de qualquer um que necessitasse de seu consolo espiritual e temporal. Consumido pela penitência, extenuado pela doença, de temperamento fino, caminhava sempre às pressas a dar inveja a qualquer rapaz à flor da idade. Livrou muitas moças do mau caminho, foi pai dos órfãos, dirigiu locais de devoção, frequentou hospitais, conservatórios, mosteiros femininos, atendeu os encarcerados, confortou os condenados à morte e se infiltrou em meio aos soldados, a quem deu sempre uma atenção muito especial, pregou missões populares, retiros dentro e fora de Roma, foi um incansável pregador da Palavra de Deus. Bem visto pelas autoridades; raras vezes deixou de ser ouvido quando pediu recursos para ajudar os infelizes. Os ricos sempre, em sua consciência, acolhiam seus pedidos para partilhar suas riquezas em prol dos desvalidos. Embora recebesse grandes quantias, viveu pobre, sem possuir nada, desapegado de tudo.
O seu coração estava aberto aos enfermos e moribundos, dos quais pouquíssimos deixaram de ser visitados ou assistidos por ele, ou deram seu último suspiro. Passava horas no confessionário; embora vestido com o hábito dos capuchinhos, repousava apenas quatro horas por noite. O difícil era entender como conseguia fazer tantas coisas num mesmo dia. A sua humildade era profundíssima. Caminhava quase sempre de cabeça inclinada e descoberta, porém antecipava sempre a saudação às pessoas. Não gostava de revelar suas inúmeras qualidades agraciadas por Deus, mas se sentia sempre como o menor de todos e se considerava indigno de viver na Congregação, por ele fundada, e que escrevera as regras por iluminação divina.
A Congregação era composta de padres e estava sob o patrocínio de Maria Rainha dos Apóstolos. Era responsável também por promover a outra pia Sociedade, composta de homens e mulheres do Apostolado Católico, cuja missão era defender, propagar o aumento da fé e da piedade em toda a Igreja. Pe. Vicente a reconhece como sendo uma obra abençoada por Deus. O próprio Papa Gregório XVI, de saudosa memória, a via com bons olhos e por isso o presenteou a Igreja e o convento (Igreja São Salvador e algumas dependências da casa contígua a Igreja, hoje Casa Geral). Favorecido pelo Papa Pio IX, que, em 1847, aprovou e permitiu que os sacerdotes pudessem ser missionários, dando-lhes o mesmo privilégio concedido a todas as ordens regulares, e, finalmente, Pallotti conseguiu com extraordinário esforço abrir uma casa em Londres.
Promoveu a oração com muitos frutos, através do Oitavário da Epifania do Senhor . Compunha e difundia livros de devoção e de ascese a todas as famílias, alguns dos quais, o Mês de Maio, a oração semanal tirada do saltério de São Boaventura, a fim de pedir uma boa morte, e as Máximas Eternas de Santo Afonso tiveram inúmeras edições e milhares de cópias, e foram traduzidas em diversas línguas.
Difundiu o amor de Deus, da Virgem Maria Imaculada e dos Santos. De consciência pura, não menos de duas ou três vezes ao dia, prostrava-se aos pés de um sacerdote, implorando a reconciliação com Deus pela confissão. Jamais deixou de celebrar a missa, e na sua última enfermidade teve a graça de receber várias vezes o Santíssimo Viático. Durante toda sua vida, teve um apreço especial pela obediência, que nem mesmo queria morrer sem os méritos dela, encontrando-se em um doce respeito contrastado entre Deus que o convidava para estar diante de si, e o diretor espiritual que o assistia e recomendava a oração, enquanto estivesse neste mundo. Sendo assim, suas últimas palavras foram: “Peço-lhe, por favor, deixa-me ir para onde Deus me chama: amanhã, no céu, acontecerá uma grande festa” . O que mais se pode falar de sua vida!
Não poderia deixar de dizer que, o motivo da sua doença, foi devido ao excesso de trabalho por causa do já mencionado Oitavário da Epifania, que, por três dias consecutivos, parecia duplicar seu zelo, semelhante a uma chama acesa que brilhava até se consumir. Deitado, porém, em sua cama, acometido por uma pleurite, no dia 16 de janeiro, repetindo a todos que fosse feita a vontade de Deus, dando sinais de que sabia que não receberia a cura de sua enfermidade, por mais que contasse com pessoas entendidas na arte da cura, elevando sempre a Deus ardentes orações.
Poderíamos acrescentar ainda muitas outras coisas que ele fez antes da proximidade de sua passagem desta vida, mas, sem mais delongas, queremos apenas dizer que padre Vicente Pallotti teve o espírito de Jesus Cristo. Foi um perfeito modelo de sacerdote, um verdadeiro apóstolo de Roma. E seríamos ainda mais felizes se ele permanecesse por mais tempo em nosso meio. Preparado para ser ceifado e para receber a recompensa, o Senhor se antecipou em poupá-lo do sofrimento e do vale de lágrimas.

Fr. Fabi Montani
Texto traduzido da Revista Apostolato Universale, n. 23/2010, p. 8-12. Pe. Valdeci Antonio de Almeida, SAC.

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