quinta-feira, 7 de maio de 2009

Do livro: Itinerário espiritual palotino - Orações




Maria guardava tudo em seu coração.
Coloque a sua inenção pessoal.


“Ave, cheia de Graça”.

D.: Maria foi preparada por Deus, para ser a Mãe do seu Filho. Como Eva foi seduzida pela conversa de um anjo decaído e afastou-se de Deus, desobedecendo à sua palavra, Maria recebeu a boa-nova pela anunciação de outro anjo celeste e mereceu trazer Deus em seu seio, obedecendo à sua palavra.


L1.: Quando chegou à plenitude dos tempos, fixada pelos insondáveis desígnios divinos, o Filho de Deus assumiu a natureza humana para reconciliá-la com o seu Criador, de modo que o demônio, autor da morte, fosse vencido pela mesma natureza que antes vencera.


L2. Quando veio a plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho, que nasceu de uma mulher e nasceu submetido a uma Lei, a fim de remir os que estavam sob a Lei, para que recebêssemos a sua adoção. A prova de que sois filhos é que Deus enviou aos vossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: Abba, Pai! Portanto já não és escravo, mas filho. E, se és filho, então também herdeiro por Deus (Gl 4,4-7).


T.: Vicente Pallotti, ao falar da maternidade de Maria, diz: “A minha boa Mãe foi abençoada e enriquecida por Deus, inclusive com atrozes sofrimentos que parecia viver crucifixa. Ela que sempre venerou as chagas de Jesus, no final de sua vida, parece ter tido sempre mais a graça da crucifixão” (OOCC XIII, 929).


L3.: Eis porque, no nascimento do Senhor, os anjos cantam jubilosos: Glória a Deus nas alturas, e anunciam: Paz na terra aos seres humanos de boa vontade (Lc 2,14).
T.: Demos graças a Deus Pai, por seu Filho, no Espírito Santo, pois, na imensa misericórdia com que nos amou, compadeceu-se de nós. E, quando estávamos mortos por causa das nossas faltas, Ele nos deu a vida com Cristo (Ef 2,5), para que fôssemos Nele uma nova criação, nova obra de suas mãos.


D.: Maria ocupa um lugar muito importante na obra e na doutrina de Vicente Pallotti. Para ele, Maria é a cheia de Graça, a filha predileta do Eterno Pai, a Mãe que Deus Filho escolheu entre todas as mulheres, para tornar-se homem, a Esposa única na qual o Espírito Santo infundiu a mais pura virgindade e exuberante maternidade. Nenhuma criatura, pela sua pessoal excelência, pode ser amada e honrada como foi amada e honrada Maria, porque ela foi infinitamente amada e honrada por Deus Pai, Filho e Espírito Santo. Deus criou o ser humano à sua imagem e Maria, Mãe de Jesus, fez Deus à sua imagem. Não existe uma criatura comparável a ela, porque sua beleza é irrepetível. Por esta admirável excelência, Maria merece admiração, louvor, amor, mais do que todas as coisas criadas. Maria é também a corredentora[1].


T.: O sangue derramado de Cristo é o sangue de Maria; a carne de Jesus, flagelada e coroada de espinhos, seus membros perfurados pelos pregos e lança, são a carne de Maria. Maria aceitou a profecia de Simeão que anunciou tais sofrimentos com o símbolo da espada que traspassou seu coração. Esta Senhora bendita foi constituída por Jesus, no momento mais solene da redenção, Mãe do novo povo de Deus[2].


L4.: Pallotti queria também que seus seguidores tivessem um profundo amor e devoção à Mãe de Deus, que todos fossem fervorosíssimos apóstolos de Maria, transformados em Maria, de sorte que, depois de Jesus Cristo, o seu coração, os seus movimentos internos, as suas palavras e os seus olhares, seus passos e ações fossem de Maria, porque um verdadeiro devoto de Maria não só se salvará, como se tornará grande santo (OOCC V, 447).


T.: Gostaria que todas as criaturas respeitassem e venerassem profundamente os nomes de Jesus e de Maria (OOCC X, 99).
Reflexão bíblica: (Lc 2,16-21) – Todos os que ouviram os pastores, ficaram maravilhados com aquilo que contavam. Maria guardava todos esses fatos e meditava sobre eles em seu coração.


D.: Continuemos nossa oração, ouvindo os conselhos de Maria, conforme os escritos de Pallotti, no seu livro Mês de maio para leigos.


L5.: Filho, é do teu agrado ser chamado filho de Deus, eterno, imenso, amor infinito? Ou preferes renunciar esta filiação? Sabe que, cada vez que pecaste e foste rebelde ao Pai Celeste, renegaste a paternidade divina.


L6.: Com afeto materno, peço-te para refletires que ser chamado filho de Deus te dá o direito de herdeiro. É verdadeiro direito e tem tanta força que, mesmo sendo Onipotente, Deus não pode tirar esse direito, se tu não o renuncias por um ato livre da tua vontade que se denomina pecado, pois assim determinou Deus misericordioso em seus decretos, motivado pelo amor infinito que tem para com as pessoas redimidas pelo sangue do Cordeiro Imaculado.


D.: Mas, se queres consolar tua Mãe, filho, contempla o meu divino Filho. Eis Jesus Cristo: “Santo, Inocente, Imaculado, segregado dos pecadores e elevado acima dos céus” (Hb 7,26), figura e imagem viva e perfeita da substância do Pai. Quero saber se desejas tê-Lo por teu irmão primogênito (Rm 8,29), de modo a poderes dizer com toda fé: Creio em Jesus, Verbo Encarnado, Redentor do mundo. Filho de Maria é meu irmão! Gostarias de ter Jesus como teu irmão primogênito? E ser com Ele herdeiro de Deus Pai? Pois sabe, para teu consolo e salvação, que o título de filho de Deus comunica não apenas o direito de possuir Deus, mas te faz coerdeiro de meu divino Filho, Jesus Cristo (Rm 8,17). Logo, como filho de Deus, és também elevado à sublime honra de irmão do divino Verbo Encarnado, com o qual poderás gozar por toda a eternidade da suprema herança: Deus[3].


Pai-Nosso, Ave-Maria


Oração
Ó Deus, que, pela virgindade fecunda de Maria, destes à humanidade a salvação eterna, dai-nos contar sempre com a sua intercessão, pois ela nos trouxe o autor da vida. Por Cristo, Nosso Senhor. Amém.
Bênção final
Que o Senhor nos abençoe, guarde-nos de todo mal e conduza-nos à vida eterna. Amém.
[1] DE ALMEIDA, Valdeci Antonio, op. cit., p. 135.
[2] Ibidem, p. 135. OOCC XIII, 725.
[3] PALLOTTI, Vicente. Mês de maio para leigos. Santa Maria: Biblos, 2ª Edição, 2008, p. 57-58.

Da Revista: Apostolato Cattolico - Roma



SÃO PAULO APÓSTOLO NOS ESCRITOS DE SÃO VICENTE PALLOTTI

Jan Kupka SAC
Diretor do Instituto São Vincente Pallotti, Roma
Roma, 7 fevereiro de 2008


PREMISSA

São Paulo foi um grande missionário. O Senhor o escolheu para levar o Evangelho até os confins da terra, para pregar a boa notícia da salvação a todas as pessoas. A vocação de Saulo e a vida de Paulo representam uma graça para a Igreja. Até hoje está nas mãos de Deus, um instrumento de salvação para todos os seres humanos, segundo as palavras do Senhor dirigidas a Ananias, em Damasco: “Este homem é um instrumento que eu escolhi para anunciar o meu nome aos pagãos, aos reis e ao povo de Israel” (At 9, 15). Os dotes humanos e espirituais de são Paulo tornaram-se fontes de inspiração para toda atividade missionária e apostólica.
São Vicente Pallotti tinha muito orgulho de viver na cidade de Roma, porque, nela, o apóstolo Paulo pregou o Evangelho da Salvação. Os relatos sobre a vida e o martírio sofrido por Paulo em Roma, juntamente com tantos homens e mulheres, durante a perseguição ocorrida entre os anos 60 e 70 do primeiro século da era cristã, permaneceram sempre vivos na história romana, como no coração de são Vicente Pallotti. Isso pode ser confirmado por alguns fatos, sobretudo pelos escritos do nosso Santo, como veremos ao longo desta reflexão.
1. São Paulo na vida de Pallotti
Uma pesquisa sobre a biografia de são Vicente Pallotti descobriu elementos em sua vida que contribuíram para o seu fascínio à figura espiritual de são Paulo apóstolo. Isso leva a crer que alguns acontecimentos de seu tempo colocaram uma forte evidência à pessoa de são Paulo. Podem-se elencar os seguintes fatos:
1.1 A festa de São Paulo
Havia em Roma uma longa tradição de celebrar duas festas dedicadas a são Paulo apóstolo. A primeira era a Comemoração de são Paulo, celebrada no dia 30 de junho. Foi instituída pelo Papa são Gregório I, em 590, separando-a da festa comum dos santos apóstolos Pedro e Paulo, que se celebrava no dia anterior, 29 de junho. A razão dessa divisão foi porque havia duas Basílicas um tanto distantes uma da outra.
A segunda festa era a Conversão de são Paulo, celebrada no dia 25 de janeiro, criada pelo Papa Inocêncio III, em 1198, para agradecer a Deus pela prodigiosa conversão do apóstolo e para propor aos fiéis um exemplo da eficácia da graça de Jesus Cristo.
Ao longo dos séculos, porém, a festa da Comemoração de são Paulo ficou unida àquela do dia 29 de junho, na qual se celebra os santos Pedro e Paulo, príncipe dos apóstolos e modelo de vida cristã. O costume de celebrar juntos os dois grandes apóstolos Pedro e Paulo, no dia 29 de junho, foi divulgado desde o tempo de Gregório XVI.
No tempo de Pallotti existia também a tradição de venerar são Paulo com duas festas, 25 de janeiro a Conversão de são Paulo e 30 de junho a comemoração de são Paulo apóstolo. Estas duas festas eram, sem dúvida, a ocasião propícia para meditar sobre a vida do grande apóstolo dos gentios e sobre sua atividade apostólica.
Os textos de Pallotti deixam transparecer a sua predileção pela festa da Conversão de são Paulo, celebrada no dia 25 de janeiro. “No regulamento da Pia Casa de Caridade de Roma”, Pallotti estabeleceu que, no dia da Conversão de são Paulo, o presidente dos procuradores devia convidá-los todos para uma conferência, para despertar neles o espírito de caridade e de zelo, como também para torná-los mais ativos.
Isto pode ser confirmado por uma carta, escrita no dia 25 de janeiro de 1848, a um religioso de Piacenza, Giovanni Battista, com os seguintes dizeres: “Roma, Santos Retiros de São Salvador in Onda, 25 de janeiro de 1848, dia da Conversão de são Paulo apóstolo. Reze pela minha conversão e do mundo inteiro.
Pallotti menciona também, em seus escritos, a festa da Comemoração de são Paulo, celebrada no dia 30 de junho. No texto “Na minha morte”, escreve: “No dia da festa dos gloriosos Príncipes dos Apóstolos, após ter confessado ao longo da manhã da dita solenidade, ao sair de casa para realizar a uma obra de caridade, por várias vezes, escarrei sangue; o mesmo aconteceu no dia seguinte, na Comemoração do Apóstolo dos Gentios, são Paulo, era um domingo”.
Neste breve texto, Pallotti fala da sua doença e, ao mesmo tempo, sublinha que o fato aconteceu no dia da Comemoração de são Paulo (domingo, 30 de junho de 1839). De fato, conferindo o calendário do referido ano e mês, as informações correspondem: Domingo 30 de junho de 1839, dia da Comemoração de são Paulo e também em 1840, terça-feira, 30 de junho, Comemoração de são Paulo apóstolo.
1.1 A Basílica de são Paulo fora dos muros
A figura de são Paulo, apóstolo dos gentios, era conhecida de Pallotti por meio da Basílica de são Paulo fora dos muros. Nela, tudo fala de são Paulo, tudo concorre para a glorificação da sua prodigiosa vida e atividade missionária e apostólica.
Alguns acontecimentos, no tempo de Pallotti, despertaram nas pessoas um grande interesse pela Basílica de são Paulo. Primeiro foi o grande incêndio ocorrido na noite entre 15 e 16 de julho de 1823, que suscitou uma grande consternação, não somente ao povo romano, mas em todo o mundo cristão. Pallotti não podia estar alheio à mobilização de todos para a reconstrução daquela esplendida Basílica.
O Papa Leão XIII, em 1825, por ocasião do Ano Santo, convocou o mundo católico para ajudar na reconstrução da mesma. Gregório XVI, em 1840, reabriu uma das naves da Basílica para o culto e, em 1854, o Papa Pio IX consagrou-a novamente.
O vínculo de Pallotti, com a Basílica de são Paulo, fica evidenciado pelos contatos com os monges beneditinos daquele tempo. Isso pode ser confirmado pela avaliação do opúsculo de Pallotti sobre o apostolado católico, escrito em 1836, pelo Procurador Geral dos beneditinos, Vicenzo Bini. O próprio Pallotti o menciona expressamente na súplica aos cardeais da Propaganda Fide.
1.2 Pia União de São Paulo
O conhecimento da figura de são Paulo apóstolo contribuiu para que Pallotti tivesse contato e participasse das atividades da Pia União de São Paulo Apóstolo, iniciada em Roma em 1790, canonicamente aprovada no dia 17 de maio de 1797. A Pia União de São Paulo promovia a formação espiritual do clero romano e organizava as atividades apostólicas e pastorais.
Vicente Pallotti conheceu as atividades da Pia União de São Paulo, quando era estudante na Universidade Sapienza, já que o atendimento espiritual dos estudantes era da responsabilidade dos sacerdotes da referida União. Tornando-se membro desta Pia União, podia participar das conferências sobre moral, que acontecia a cada quinze dias, na Igreja de Santa Maria da Paz, na Igreja da Universidade Romana e na Igreja de Santo Apolinário.
Os sacerdotes membros da Pia União de São Paulo distinguiam-se, em Roma, pela sua espiritualidade e empenho apostólico. O próprio Vicente Pallotti entusiasmou-se com aquela espiritualidade, encontrando nela seu impulso e zelo apostólico nas muitas obras de caridade cristã. Procurou envolver também seus colaboradores nesta obra e tornou-se seu divulgador.
Entre os livros conservados no quarto de são Vicente Pallotti, encontra-se um opúsculo intitulado: “Pia União de São Paulo Apóstolo, ou seja, Congregação dos Operários Evangélicos que, sob a invocação do glorioso são Paulo e sob a proteção de Maria Santíssima, Rainha dos Apóstolos, instituiu-se na Diocese de Senigallia, no ano de 1844”.
É interessante notar, no título, a típica expressão de Pallotti: “Sob a proteção de Maria Santíssima, Rainha dos Apóstolos”.
Nos outros opúsculos impressos por esta Pia União, não se encontra esta invocação. O pensamento paulino aparece fortemente nos artigos 16 deste opúsculo, no qual se fala do espírito dos operários evangélicos. Eles devem estar unidos por meio de uma caridade doce, paciente e universal, procurando sempre e unicamente a glória de Deus e a salvação das almas.
2. A literatura sobre são Paulo, no tempo de Pallotti
2.1 Os textos bíblicos e patrísticos
Uma pesquisa não aprofundada dos escritos de Pallotti mostra o uso frequente de textos bíblicos. Isso faz acreditar que Pallotti tinha bastante familiaridade com a Sagrada Escritura, desde o início dos seus estudos teológicos. Normalmente as citações bíblicas encontradas em seus escritos são da Bíblia Vulgata, em latim.
Nos seus apontamentos espirituais de 1816, nos seus propósitos antes do sacerdócio, existem oito citações dos Evangelhos: cinco de Mateus, três de Lucas, duas de são Paulo, uma dos Salmos e uma do Cântico dos Cânticos. O texto que segue nota-se que é de são Paulo: “Tudo posso naquele que me conforta” (Fl 4,13).
O responsável pelos escritos de são Vicente Pallotti, na edição das Obras Completas, Pe. Francesco Moccia SAC, faz a seguinte indagação: “Quais foram os livros bíblicos que Pallotti mais gostava”? e ele próprio responde: “basta olhar no índice analítico os nomes dos escritores sagrados, frequentemente citados por ele. É claro que essas citações são importantes para os católicos de todos os tempos”.
Nas obras Completas de Vicente Pallotti encontram-se mais de duzentos textos de são Paulo apóstolo. Pallotti além de comentar alguns textos paulinos, ele os utiliza para seu caminho espiritual e para a orientação espiritual das pessoas. Em seus escritos faz sempre referência às cartas de Paulo, com a seguinte expressão: “como diz são Paulo apóstolo”.
Dentre as citações bíblicas apresentadas, os textos de são Paulo ocupam um lugar privilegiado. Para exemplificar melhor, gostaria de evidenciar dois fatores que levaram Pallotti a dar muita importância aos ensinamentos paulinos.
O primeiro são as indicações de Pallotti sobre as regras e o método a ser observado nos congressos e nas consultas. Toda reunião deverá começar, segundo ele, com a oração ao Espírito Santo e à Maria Rainha dos Apóstolos. Em seguida, ao toque da campainha, todos devem ficar de pé, em silêncio e com muita devoção, como se escutassem o Apóstolo são Paulo, ler-se-á o capítulo 13 da Primeira Carta aos Coríntios, traduzida na própria língua e que contenha as necessidades da caridade”. Para maior compreensão, Pallotti pede que seja lido o texto em italiano (nel nostro volgare), não em latim, mas no italiano corrente.
Outro exemplo para mostrar a importância dos textos de Paulo, é a recomendação feita por Pallotti aos seminaristas da Congregação: “No início do primeiro ano de filosofia até todo o curso da sagrada teologia devem decorar das Epístolas de são Paulo cerca de vinte e cinco versículos por semana, e os recitarão na sala de aula, expondo a história do Antigo e do Novo Testamento”.
Seria possível, hoje, decorar todas as Cartas de são Paulo? Seria conveniente essa recomendação em nossos dias? Provavelmente Pallotti conhecia de cor, em latim, os textos de são Paulo, porque suas citações, nem sempre são precisas, em seus escritos.
Além da referência da Sagrada Escritura, com seus comentários, Pallotti mostra grande conhecimento da patrística em suas citações. Isso significa que ele conhecia bem os padres da Igreja e as obras publicadas em sua época. A prova disso está no texto em que Pallotti expõe o significado das palavras de são Paulo na Carta aos Romanos: “Eu gostaria de ser amaldiçoado e separado de Cristo em favor dos meus irmãos de raça e de sangue” (Rm 9,3). Após essa citação, Pallotti escreve: “Cornelio van den Steen, no capítulo 9 da carta aos Romanos nos refere que Teodoreto, Ecumenio, Anselmo, Teofilatto, Soto, Catarino, Cassiano e João Crisóstomo explicam o subdividido passo do dito Apóstolo, fazendo ver que são Paulo não queria nem a maldição de Deus, nem a sua inimizade, mas que o submetesse a qualquer pena ou sofrimento, ainda que sofresse eternamente no inferno, sem, porém, perder por sua própria culpa a amizade de Deus, para salvar os seus irmãos”.
Neste breve texto, é possível ver referência de vários autores, porém o preferido do santo para descrever o retrato espiritual de são Paulo é são João Crisóstomo: “São João Crióstomo, falando do espírito de são Paulo, desejoso também dos sofrimentos por amor de Jesus Cristo, diz: como uma chuva de granizo que cai sobre ele, é como se estivesse no paraíso”.
Diante disso, quero acrescentar que são João Crisóstomo distinguiu-se pela sua entusiástica admiração pelo apóstolo Paulo, do qual comentou todo o epistolário, quase sempre sob a forma de homilia.
2.2 Os livros históricos e teológicos

No tempo de são Vicente Pallotti, recomendava-se muito a leitura espiritual, e ele tirou proveito dos livros para a sua formação no campo espiritual. Folhando seus escritos, nota-se muitas referências bibliográficas de santos, documentos eclesiásticos, livros filosóficos e teológicos. As obras mais citadas eram os dicionários históricos e teológicos. E sobre são Paulo apóstolo, merece destaque dois dicionários.
O primeiro dicionário é de Gaetano Moroni, autor do famoso dicionário de erudição histórica, em 103 volumes, publicados entre os anos 1840 a1861. Gaetano Moroni nasceu em 1802, em Roma, na paróquia de santo Apolinário. Em 1831, o Papa Gregório XVI nomeou-o seu primeiro colaborador. Morreu em Roma, em 1883, e foi sepultado no Campo Verano, na capela da Arquiconfraria do Preciosíssimo Sangue. Segundo dados históricos, confirmam-se que Pallotti conhecia-o pessoalmente, pois, no arquivo do Instituto São Vicente Pallotti, conservam-se duas cartas escritas a Gaetano Moroni. Por isso, podemos dizer que Pallotti conhecia seu pensamento historiográfico.
No volume 51 do seu dicionário, Gaetano Moroni inseriu um artigo sobre são Paulo apóstolo, a quem dedicou dez páginas. Ele fez uma descrição detalhada da vida e do apostolado de são Paulo, com referências dos padres da Igreja e pesquisas daquele tempo. Entre tantas coisas, lemos: “São Paulo, como Barnabé e Matias, embora não tivessem feito parte dos doze apóstolos, escolhidos por Jesus, receberam este título e foram agregados ao Colégio Apostólico, porque o próprio Jesus Cristo chamou-os de modo particular, por terem propagado o cristianismo como os demais apóstolos.
Outro dicionário é o do famoso teólogo francês Nicolau Silvestre Bergier (1765-1791), autor do dicionário enciclopédico de teologia e da história da Igreja, publicado em língua italiana, em 17 volumes, nos anos de 1820 a 1822. Ele era teólogo de vanguarda naquele tempo, e pertencia ao grupo de teólogos progressistas. Pallotti também conhecia esse dicionário, pois faz referência dele em seus escritos, quando explica seu conceito de apostolado.
A curiosidade nos leva a ver o que Bergier escreveu sobre são Paulo em seu dicionário. Vejamos: “São Paulo não era uma pessoa emocionalmente fraca, nem um visionário. Os escritos e as reflexões sobre ele, sobre sua conduta provam o contrário; nem mesmo seus opositores tiveram a coragem de negar sua capacidade, estudo e talentos. Por qual aspecto você olhar, deve admitir, nele, uma miraculosa mudança”.
O livro espiritual favorito de são Vicente Pallotti era a Mística Cidade de Deus, da mística espanhola Maria de Agreda. Nos seus escritos encontram-se referências do livro desde 1816 a 1849. Ele queria que este livro fosse colocado na mesa, no momento de sua morte. A predileção de Pallotti pela conversão de são Paulo e pela sua atividade apostólica, parece ter sido tirada deste livro.
Maria de Agreda descreve que Maria Santíssima, ao ver Paulo perseguir a Igreja, rezou insistentemente a Deus para sua conversão. O Senhor disse-lhe: “Minha Mãe, eleita entre todas as criaturas, faça-se a sua vontade sem demora, eu farei com Saulo tudo aquilo que pedir, e farei que ele, de imediato, torne-se defensor da minha Igreja, a qual persegue e o farei dele pregador da minha glória e do meu santo Nome. Eis que o receberei amigavelmente com a minha graça”. Estas palavras parecem tocar profundamente Pallotti, conhecendo sua devoção à Maria.
3. O retrato espiritual de são Paulo nos escritos de Pallotti

As notícias sobre são Paulo apóstolo, na história de Roma, e na literatura no tempo de são Vicente Pallotti, permitem compreender melhor o retrato espiritual deste grande apóstolo que emerge dos escritos do nosso santo. Daí surgem as perguntas: Que imagem Pallotti tinha, diante de si, do apóstolo Paulo? Que aspectos espirituais de são Paulo emergem dos seus escritos? Uma pesquisa dos textos de Pallotti permite individuar os seguintes pontos da figura de são Paulo:

3.1 São Paulo, homem que conhece a si mesmo

São Vicente Pallotti via são Paulo como homem que conhecia bem a si mesmo. São Paulo afirma frequentemente, em suas cartas, que foi um grande pecador, porque perseguia com firmeza os discípulos de Cristo e a sua Igreja. Confessava com humildade as suas debilidades e suas enfermidades. Pallotti discorria sobre o traço espiritual de são Paulo, usando as palavras do próprio Apóstolo: “Quanto a esse homem, eu me gabarei; mas quanto a mim, só vou gabar-me das minhas fraquezas. Ele, porém, respondeu-me: Para você basta a minha graça, pois é na fraqueza que a força manifesta todo o seu poder. Portanto, com muito gosto, prefiro gabar-me de minhas fraquezas, para que a força de Cristo habite em mim” (2Cor 12,5.9). São Paulo considerava o conhecimento do próprio limite e da própria enfermidade como fraqueza da natureza, por isso deixava agir em si a graça de Deus.
Pallotti utilizava este aspecto espiritual de são Paulo para analisar seus próprios defeitos e dos outros. A isso damos o nome, hoje, de correção fraterna. Pallotti escreve: “Aquele que for advertido, assim que ouvir seu nome, deve colocar-se de joelhos, com grande humildade, e recordando que são Paulo alegrava-se porque conhecia suas fraquezas. Essa condição lhe era útil para, cada vez mais, humilhar-se para estar sempre cheio da virtude de Jesus Cristo”.
3.2 São Paulo amava a Deus e às pessoas
São Vicente Pallotti admirava em são Paulo o seu amor apaixonado por Deus e pelas pessoas. Após a sua conversão, Paulo não perdeu seu caráter violento e impetuoso, mas colocou tudo à serviço de Cristo e do Evangelho. Ele procurava uma só coisa, o amor de Jesus. O amor de Cristo para ele era a única força que o impulsionava a dedicar-se aos outros.
Pallotti exaltava, em são Paulo, a caridade apostólica e acolhia com coração aberto as suas palavras: “Vivam no amor, assim como Cristo nos amou e se entregou a Deus por nós, como oferta e vítima, como perfume agradável” (Ef 5,2).
Para Pallotti, Paulo foi um exemplo de caridade, pois amou até seus perseguidores. Grande também era sua solicitude pastoral junto aos pagãos, ainda que fossem pecadores e necessitados de correção. Tornou-se verdadeiro pai para todas as pessoas, como mostra a carta aos Gálatas: “Meus filhos, sofro novamente como dores de parto, até que Cristo esteja formado em vocês” (Gal 4,19).
3.3 São Paulo, homem de grande zelo e coragem
São Vicente Pallotti admirava, em são Paulo, seu ardor apostólico e a coragem com que enfrentou todo tipo de prova e os inúmeros perigos em suas viagens apostólicas. Ele nunca deixou-se desencorajar pelas situações difíceis, não somente físicas, como morais, demonstrando possuir uma força interior imbatível. Isto, porém, não o impediu de manifestar sua humanidade.
Por isso, Pallotti recomenda aos seus procuradores que o imitem no seu zelo e coragem. Ele escreve: “Como o apóstolo são Paulo, cheio de zelo, cuidava e tinha a mais viva solicitude por todas as Igrejas, assim o Procurador Designado, que tem seu ofício sob a especial proteção deste grande Apóstolo, deve competir no zelo, na caridade, com a prática da mais ativa solicitude de todas as atividades comuns”. Pallotti fala de zelo universal de são Paulo, isto é, não agia com o espírito de parcialidade, mas acolhia e dirigia-se a todos.
3.4 São Paulo, apóstolo dos gentios
São Vicente Pallotti via são Paulo como o grande apóstolo dos gentios. Esta expressão, apóstolo dos gentios, aparece frequentemente nos escritos de Pallotti. Para ele, Paulo merecia este título porque se preocupava com todas as Igrejas: “A minha preocupação cotidiana, a atenção que tenho por todas as Igrejas” (2Cor 11,28). Por isso Pallotti coloca são Paulo como modelo para todos os procuradores, escrevendo: “O Apóstolo dos gentios, são Paulo, ao promover, por todos os modos possíveis a maior glória de Deus e de sua Santíssima Mãe Imaculada, e a maior santificação da cidade, nação ou diocese”. Pallotti, tendo em mente a visão universal de são Paulo, assegura-lhe um lugar privilegiado entre os procuradores: “Cada um dos Procuradores Primários é nomeado para cooperar com uma parte do mundo, visto que o mundo foi dividido em doze partes. Teria ainda outra procuradoria, a décima terceira, que seria a alma de todas as outras, cuja imitação do Apóstolo são Paulo lembrava a solicitude por todas as Igrejas, por isso, não deveria ter uma parte determinada do mundo, mas deve acolher todas em seu coração”.
4. São Vicente Pallotti, imitador de são Paulo e anunciador de sua doutrina
São Vicente Pallotti desejava imitar são Paulo, conforme o convite do próprio Apóstolo: “Dou-lhes um conselho, sejam meus imitadores” (1Cor 4,16). Este propósito encontra-se no seu escrito que diz: “Pretendo pedir perdão com a dor de todas as criaturas, imaginando estar prostrado com a face por terra, na estrada de Damasco, pedindo perdão juntamente com Paulo”. Diante disto, podemos dizer que encontramos, na vida de Pallotti, muitos traços espirituais de são Paulo. Mas não é só isso, Pallotti faz-se anunciador do ensinamento de são Paulo. As palavras do grande Apóstolo ecoam em tantos momentos de seus escritos. Eis alguns exemplos, quando ele fala das pessoas consagradas: “Mas uma alma, quando chega ser chamada filha de Deus, sabe de quem é herdeira. Isso foi dito por são Paulo, Apóstolo do Filho Deus: ‘Se somos filhos, somos também herdeiros: herdeiros de Deus, herdeiros junto com Cristo, uma vez que, tendo participado dos seus sofrimentos, também participaremos da sua glória’ (Rm 8,17). É herdeiro de Deus. Mas o que significa ser herdeiro de Deus? Quer dizer, o próprio Deus é a Herança. Diga-me, você gostaria de tomar posse dessa herança? Indico-lhe que possua a Santíssima Trindade, para poder dizer: o Pai é meu, o Filho é meu, o Espírito Santo é meu, a Potência de Deus é minha, a Sabedoria de Deus é minha, a Bondade de Deus é minha, a Pureza de Deus é minha, o Amor infinito de Deus é meu, a Misericórdia de Deus é minha, Todo Deus é meu”?
Na Regra da Congregação do Apostolado Católico, explicando a prática da modéstia, diz: “Como disse são Paulo: ‘Glorifiquem a Deus no corpo de vocês’ (1Cor 6,20). Esse ensinamento quer ensinar-nos que devemos viver com o coração e com a mente unidos e voltados para Deus e que todas as nossas obras externas sejam reguladas pelo Espírito de Deus, do qual todos devem estar repletos”.
Pallotti evoca o ensinamento de são Paulo, até mesmo para as coisas do dia a dia: “Todos os membros da Congregação da Pia Sociedade devem nutrir-se suficientemente e com moderação, e evitem todo tipo de estravagância e escândalo no uso dos alimentos e bebidas, a fim de que, observando a devida temperança, observem o preceito do Apóstolo são Paulo, que diz: ‘Quem come de tudo, o faz em honra do Senhor, porque agradece a Deus. E quem não come, não come em honra do Senhor, e também agradece a Deus’” (Rm 14,6).
Conclusão
Esta pesquisa quis dar apenas uma visão geral do tema proposto. Uma leitura mais aprofundada dos escritos de Pallotti poderá suscitar outros aspectos espirituais de são Paulo. Parece que Pallotti deu mais preferência àqueles traços espirituais que lhe serviam para ajudar os cristãos a serem pessoas espirituais e apostólicas, em consonância com sua espiritualidade. As suas citações evidenciam mais a conformidade com Jesus Cristo e a transformação em Cristo, por isso sublinha o amor e o ardor apostólico de são Paulo.